[1] Professor
Arte-educador, roteirista e documentarista, desenvolve pesquisa na linha de
Antropologia Audiovisual com tese em desenvolvimento na Universidade de Lisboa, Portugal.
Revi paisagens dos poucos
momentos que visitei uma Alemanha contemporânea,
o trem que entrei e saí da cidade, do aeroporto à estação central de Berlim. Da janela vi galhos secos do
rigoroso inverso com 11 graus negativos e os desérticos campos de neve, parecia
o mesmo cenário do filme ‘A menina que roubava livros’, do diretor Brian
Percival, do livro homônimo do australiano Markus Zusak.
Veja o trailer
.htmlhttp://www.ameninaqueroubavalivros.com.br/video-1.html
O encanto pela obra de Zusak me
faz revelar sentimentos de amor à arte que abraço, que é o cinema, embora esteja tão longe dessas milionárias
produções que merecem nosso respeito e
admiração. Mas não me excluo de aprender com
esses mestres e arrisco dar o meu palpite como aprendiz e realizador que sou.
Antes destaco a participação de renomados atores da
dramaturgia cinematográfica, entre os iniciantes talentos mirins, formando um
time na escola de conteúdos e narrativas na linguagem audiovisual que
estudamos. São eles: Sophie Nélisse, Geoffrey Rush, Ben
Schnetzer, Roger Allam, Barbara Auer e a talentosa e premiada Emily Watson.
O que me intriga, inicialmente,
é a presença do narratário dentro do filme;
não sabemos quem desenvolve a história em ‘OFF’ que conhece
tão bem os personagens e segue até o final sem dar pistas
mais claras aos contempladores mais desatentos. Confesso que não decifrei os códigos apresentados deste esboço dramático com algumas suspeitas que só revelo no
final desta percepção.
Há algum tempo não assistia a um filme tão sério, como tão
séria é a história de uma menina entregue a uma família de camponeses na aldeia
de Molching, na ascendente Alemanha de 1938. Liesel Meminger é analfabeta e
aprende a ler as palavras pela necessidade de ter a companhia do pai adotivo,
que lhe ensina a compreender o lado humano das pessoas em meio a uma guerra que
se inicia e seduz toda uma população
à esterilidade literária, queimando livros em praça pública, ordem do general Hitler.
O encontro entre pai e filha
desencadeia uma relação de cumplicidade nas noites nevadas
do lugar, e a leitura, inicialmente acidentada, passa a ser a razão de ser dos dois personagens que dividem as páginas
dos livros que Liesel “rouba” no entusiasmo de aprender a ler. No exercício da aprendizagem,
cai em suas mãos o pensamento filosófico de Aristóteles
de que “a memória é a escriba da alma”. Emily Watson, a "Mama", denuncia o humano sentimento de cooperação e tem que representar a dureza de um sistema posto e inquestionado, para marter-se viva, como todos os personagens envolvidos naquela história.
A escola do “partido” que
Liesel frequenta reproduz uma educação
cívica de intolerância e racismo e os alunos
cantam a propaganda de um sistema de purificação humana inventado por um grupo político e que
manipula a fragilidade de mentes famintas e ávidas por dias melhores. Assim
era a Alemanha humilhada ao final da primeira grande guerra e que agora precisa se
afirmar diante do mundo, e assim acreditavam.
Amigo de Liesel, o menino Ruddy [é assim que se escreve?]
desenha as cenas mais leves do filme, nos mostra a fidelidade de uma amizade e a defesa da inocente
paixão entre duas crianças
que tentam crescer entre bombardeios e sirenes nos subsolos, aglomerações aliviadas entre a música de um sanfoneiro e as
histórias recriadas em memória pela menina que rouba livros. Os dois
guardam um segredo: Max, um judeu que se esconde no porão da casa de Liesel.
As histórias contadas por
Liesel no esconderijo fala de um estranho que chega ao povoado em meio à escuridão e que era proibido de contemplar as estrelas, tão pouco o sol, este desenhado na parede. Ele carrega um
livro nas mãos, que é cobiçado pela curiosidade da menina, protagonista de sua própria fábula. Imaginação e realidade se misturam para confundir os ouvintes em
vigília das bombas incendiárias que caiam.
As histórias contadas por Liesel no esconderijo fala de um estranho que chega ao povoado em meio à escuridão e que era proibido de contemplar as estrelas, tão pouco o sol, este desenhado na parede. Ele carrega um livro nas mãos, que é cobiçado pela curiosidade da menina, protagonista de sua própria fábula. Imaginação e realidade se misturam para confundir os ouvintes em vigília das bombas incendiárias que caiam.
De volta à sua fonte de motivação, Liesel ganha de presente um livro com páginas em branco, o mesmo livro carregado pelo estranho que é sobre a 'doutrina de Hitler'. As páginas foram pintadas para destruir imagens e palavras, como um esmalte corretivo que apaga um texto imprestável, e que agora estão prontas para serem reescritas no desejo de reconstruir uma nova historia. Eles acreditam no poder das palavras e que transformam a vida.
A ação de escrever de Liesel apresenta dois significados que a salva de duas situações: uma é a liberdade da alma que todo escritor e poeta busca no mundo dos aedos; a outra é a blindagem inconsciente de um bombardeio que extermina a aldeia, pois ela sobrevive no porão de sua casa ao escrever, às escondidas, as páginas em branco de sua memória.
Lembram do narratário do filme? Pois, sim! Suspeito que seja a morte impressionada em compreender a vontade de um homem promover uma guerra e, ao mesmo tempo, incomodada por desejar saber como dela [da guerra] outros homens conseguem sobreviver, e elege Liesel para contar uma história única e inusitada!
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